NOSSA HISTÓRIA
Como
bom português, meu pai tinha o nome de Manoel. Mas não me lembro de jamais ter
ouvido alguém chamá-lo assim; nem mesmo minha mãe. Ele a chamava Almira, ou
Mira; mas ela nunca o chamou senão de Ferreira.
Não
que ele fosse rigoroso, ou algo assim. Pelo contrário: era um cara boa
praça, bon vivant; jamais fez questão de ser chamado de "senhor", nem
mesmo pelos filhos. Mas, não sei se por causa de minha mãe, era assim que o chamávamos.
Éramos
uma família de classe média, mais para baixa. Meu pai nunca teve carro e nossos
passeios eram feitos de ônibus, por mais longa que fosse a viagem; inclusive eventuais piqueniques. Se fosse hoje, faríamos parte dos "farofeiros".
Morávamos
perto da praia e as lembranças mais fortes que tenho de meu pai são nos
levando ao banho de mar, às 6 da manhã, antes que ele e minha mãe abrissem
a loja; nós jogando damas, ou ele ao bandolim, em músicas
portuguesas.
De
Alvinho para mim, 6 ou 8 anos de diferença; não lembro bem. Ele se casou muito
jovem e eu, aos 15 anos, fui para São Paulo, onde fiquei interno em uma escola
militar, por 2 anos.
Quando
voltei, meus pais estavam separados e fiquei ajudando minha mãe a tomar conta
da loja. Não que eu trabalhasse muito, confesso: aos 17, com os hormônios em
plena efervescência, as minhas atividades mais constantes eram namorar, jogar
bola e curtir a Jovem Guarda.
Não
sei quanto tempo passamos assim. Alvinho estava casado e Jairo era muito
novinho; nesse tempo, a minha companhia constante era Regi: frequentávamos a
mesma turma, da qual também faziam parte as nossas namoradas. Foi uma época de
muita birita e música, curtindo a juventude.
Depois,
tudo mudou: a loja fechou e minha mãe precisou voltar para o Rio, onde tinha
parentes; com ela, foram Regi e Jairo. Eu, aprovado em concurso para o Banco do Estado da Bahia, fui
morar em Feira de Santana, numa pensão barata; hoje, pouca gente sabe o que é "pensão",
mas foi mais uma experiência.
Anos se passaram. Fiquei
noivo; terminei o noivado e acabei casando com outra. E foi quando voltamos a
nos ver, por dois ou três dias: no meu primeiro casamento, antes que eles
voltassem para o Rio. Até hoje, rolou muita água por baixo da ponte; mas vou
parar aqui. Quem sabe, algum dia conto o resto; se der tempo.
Meu pai, Alvinho, Mira e Regi já se foram; tenho sonhado com Mira e Regi, nos últimos tempos. Não
acredito em presságios e não tenho medo de morrer; aliás, vivo uma dicotomia:
não quero deixar meus entes queridos, mas também não quero envelhecer demais; Mira
foi aos 99 anos, e os últimos não foram fáceis.
Como se diz, aqui na Bahia: o que der, pra mim é lucro; ou prejuízo. Mas, de toda forma, os sonhos reavivaram as saudades. E esta é a razão deste texto.



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