O FEIJÃO E O SONHO

Li, há muito tempo, "O Feijão e o Sonho", de Orígenes Lessa.

Um dos melhores livros que já li, inclusive. De todos, prefiro "O Profeta"; depois, vem "O Pequeno Príncipe", esse do Orígenes e outros. Parece que tenho sorte com livros de tamanho pequeno e grande conteúdo.

Não vou ficar citando, até porque esqueceria alguns; mas esse me marcou, particularmente. Dizem que a gente gosta do romance, quando se identifica com o personagem; essa talvez seja uma das razões.

A história gira em torno de um casal formado por pessoas bem diferentes. Ela tem um senso prático marcante, pensa nas coisas do dia-a-dia, da vida; ele vive num mundo de sonhos, tem uma visão romântica e idealista de tudo.

Percebi, agora, que preciso reler o livro; não me lembro direito do final. Mas lembro-me bem que eles se amam e precisam conviver com essas diferenças; vão seguindo em frente, com muitas brigas, e só o amor os mantém juntos.

Essa é a história; ela representa o feijão e ele o sonho. Na vida real, todos necessitamos do feijão, que sustenta o corpo, e dos sonhos, que alimentam a alma. Ou seja: é a história e o dilema de todos, que somos corpo e alma.

Li e reli o livro, algumas vezes. Desde a primeira vez, me identifiquei com o personagem: sempre fui sonhador, sem noções do feijão e sem entender porque só eu pensava assim; focava nos sentimentos, sem ligar para o resto.

Na época em que conheci o livro, eu estava em outro casamento. Talvez por isso, me afeiçoei tanto a ele: era a minha própria história e eu conseguia perceber isso, mas não sabia qual seria o final, ou como sair do contexto.

A minha incapacidade de lidar com o "feijão" me custou caro: não apenas o casamento (que, aliás, não tinha como dar certo, mesmo), mas todo o esquema de vida que eu havia construído, aos 30 e tantos anos.

Mas é como reza o ditado: há males que vêm para bem. Certo que "roí beira de sino" durante alguns anos; tive que começar de novo, em um ambiente bem diferente de tudo que conhecia, e não foi nada fácil, mas valeu a pena.

Hoje, tenho outro relacionamento e outra visão de relacionamentos. Claro que temos nossas diferenças e alguns conflitos, mas esses são poucos e assim vimos seguindo em frente, há uns 40 anos, felizes na maior parte do tempo.

Não somos perfeitos, mas nos entendemos e amamos. Com ela, aprendi muita coisa; e tenho certeza de que lhe ensinei outras tantas. Aprendi a lidar melhor com a parte do "feijão" e ajudei-a a viajar mais pelo mundo dos sonhos.

Porque a verdade é que, enquanto estamos aqui, precisamos viver do feijão e com o sonho; encontrar o equilíbrio entre os dois. Sonhar com a beleza do céu e das nuvens, mas mantendo os pés firmes no chão, para não cairmos.

Sei que ela não é o feijão e eu não sou mais só os sonhos; misturamos os dois. Batalhamos pelo nosso feijão; o cozinhamos e comemos juntos. Mas também é juntos que viajamos por nossos sonhos... e muitos conseguimos realizar.

Acho que estamos harmonizando o feijão e o sonho.

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