A LENDA DO AMOR


Conta-se que um casal de jovens viajava pelas estradas da Vida.

E, em uma das curvas, encontraram três lindas crianças, tão semelhantes que pareciam irmãs. Igualmente belas, e tão parecidas em seu encanto, era entretanto fácil diferenciá-las.

O menino, lindo e capaz de despertar os mais belos sonhos, a tudo parecia alheio; aos viajantes estendia as mãos, e no seu olhar brilhava toda a confiança do mundo, como se os sonhos para sempre pudessem durar.

As meninas, que como irmãs o cercavam, e pareciam conduzi-lo ao tempo em que eram por ele conduzidas, tão diferentes eram entre si que só a beleza as igualava.

Uma, exibia o riso fácil e confiante da criança que ainda não conheceu a sua primeira desilusão. E o som do seu riso fazia vibrar o ar, trazia o som das mais lindas melodias e o perfume das mais perfeitas rosas.

A outra era séria, e nos seus olhos brilhava a sabedoria dos séculos. Calada permanecia e, entretanto, algo havia em seu silêncio que trazia de volta os sonhos mais lindos e fazia reviver as esperanças já mortas.

Como em um mudo acordo, cada um dos jovens tomou uma das mãos do menino; e, juntos, o levaram em seu caminho. E a primeira das irmãs os acompanhou, rindo o seu riso alegre que afastava todas as sombras.

Solitária, a outra menina aguardou até que desaparecessem na primeira curva; só então, desdobrou as asas ocultas e elevou-se até o céu, onde numa nuvem se acomodou, como se nada lhe restasse senão a espera.

Esperou enquanto os jovens, na terra, caminhavam pelas mãos do menino. E os seus risos faziam eco aos risos da menina, que os acompanhava por todo o caminho como se outro não fosse o seu destino.

Entretanto, houve um dia em que um dos dois se esqueceu de dar a mão ao menino. E, embora o menino não o tenha censurado, a verdade é que nesse dia os olhos não se encontraram como antes.

E, como não foram os mesmos os risos, também os risos da menina se perderam no espaço e falsos soaram os seus ecos.

Em um novo dia, foi o outro que não deu a mão ao menino. E nesse dia foi ainda pior: ao se encontrarem, os olhos não trocavam compreensão mas mútuas censuras. E, como a Vida não resiste às mentiras, a cada vez mais fracos se tornavam os sorrisos.

E vezes houve em que o casal precisou esconder as lágrimas, após os risos falsos de cada dia. Em que a noite, ao invés de ser o momento mágico do encontro após a caminhada do dia, tornou-se o manto em que cada um escondia no sono o seu próprio desencanto.

Um dia, a menina chorou: uma única lágrima. E nessa lágrima se fez presente o pranto de todos os amantes, o  réquiem de todos os amores; e o ar se encheu com o cheiro de todas as rosas fenecidas, de todas as ilusões desfeitas.

Então, o casal ouviu o som  de asas que se aproximavam; e nesse som havia, ao mesmo tempo, o silêncio da morte e o alegre rebuliço do renascer da vida. E, ao ver descer entre eles a sua outra irmã, pela primeira vez o menino falou;

        - Deixai que me revele, pois eu sou o Amor. E, ao vir entre vós, vos trouxe a minha irmã mais jovem: a Felicidade. Calei-me, por este tempo, pois é nas vossas vozes que vibra a minha própria voz, que não existe senão em vossos corações.

       É no silêncio do Amor, que cada um pode descobrir as mais lindas canções que existem em sua alma, e sussurrá-las aos ouvidos de quem ama.

       É na  plenitude do Amor, que cada um pode descobrir a compreensão. E não oferecer o perdão como um presente a ser retribuído, mas com o frescor da água, que perdoa a quem a bebe, sabendo que assim continuará viva e ao Universo retornará.

      Entretanto, não me entendestes. Eis que nenhum de vós lutou pelo Amor que a vós se ofereceu, ou pela Felicidade que o acompanha. Como todos os outros, esquecestes de que, para amar, é preciso que dois se confundam em um único ser... assim como Deus se confunde com o Universo!

Perdoai-me, se me vou. Na verdade, não vos deixo... continuo em vós. Poucos são aqueles tocados pelas minhas asas, e menos ainda os que sob elas se abrigam. Apenas a estes confio minha irmã mais nova, a Felicidade; aos outros, deixo minha irmã mais sábia... a Tristeza!

 E de mãos dadas, o Amor e  a Felicidade abriram as asas e voaram para o céu.

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Inédito, escrito em 05/04/2001

Comentários

  1. O que dizer? Um encanto essa lenda!Adorei! abração, tudo de bom,chica

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    1. Obrigado, Chica! Meu abraço, amiga; bom fim de semana.

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  2. Me gusto la leyenda es tan dulce. Te mando un beso..

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  3. Maravilhoso! Vc tem o dom das palavras, o dom de encantar...seus sentimentos enchem os corações de beleza.

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    1. Talvez porque o meu esteja cheio dela, Pinha... com você! Beijão, bom fim de semana.

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  4. Flavio, adorei a sua postagem “A Lenda do Amor”. A história do casal que encontra as três crianças, representando o amor, a felicidade e a sabedoria, é tocante e cheia de simbolismo. A forma como você descreve a jornada deles, as dificuldades e as lições aprendidas ao longo do caminho, realmente me fez refletir sobre a importância de valorizar e lutar pelo amor em nossas vidas. Parabéns pelo texto inspirador! Grande abraço.

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    1. Obrigado, Beto; e totalmente de acordo com algo que você destaca, amigo: a importância de lutar pelo amor, em nossas vidas! Meu abraço, bom fim de semana.

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  5. Boa tarde de Paz, amigo Flávio!
    Uma beleza de texto com algo novo que me chamou atenção: a tristeza é sábia... incrível colocação.
    "Poucos são aqueles tocados pelas minhas asas, e menos ainda os que sob elas se abrigam. "
    Haja Amor e, consequentemente, Felicidade em todos corações!
    Tenha uma nova semana abençoada!
    Abraços fraternos

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    1. Grato, Rosélia. E, quanto à tristeza, amiga, um fato importante: ela sempre nos ensina alguma coisa! ;) Meu abraço, bom fim de semana.

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  6. Boa tarde Amigo Flávio,
    Que dizer de um texto tão belo, divinamente inspirado sobre o Amor?
    Uma lenda que me deixou sem palavras, porque não tinha lido nada antes, que se pudesse assemelhar a tão precioso escrito.
    Parabéns, amigo, por sua inspiração e que Deus o continue a iluminar, para ir compartilhando connosco suas reflexões, que só nos acrescentam e fazem pensar.
    Grata, Amigo!
    Beijinhos e continuação de uma boa semana.
    Emília

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    1. Obrigado, Emília, pela gentileza e amizade! Bom fim de semana, amiga, meu abraço.

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  7. Bom dia, Flávio
    Que postagem linda. Amei a frase: "É na plenitude do Amor, que cada um pode descobrir a compreensão". O amor é um excelente dom, um forte abraço.

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  8. Texto lindíssimo, cativante a sua leitura.
    Gratíssima pelas suas sábias palavras.

    Abraços.

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    1. Grato a ti, Fa, pela amizade e gentileza! Meu abraço, bom fim de semana.

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  9. Maravillosa leyenda Flavio, que deja un sabor especial despues de haberla leído, gracias amigo por vompartir
    Un abrazo

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    1. Grato, Carmen. Sempre uma alegria a tua presença, amiga; meu abraço, bom fim de semana!

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